Escrever porquê?

As palavras fogem e queimam, e tarde se descobre a vontade de escrever mais uma palavra, mesmo que encaixe retorcida esbaforida quase próximo da loucura, no minuto antes de terminar o parágrafo. A cada uma vais tu perguntando que merda faço eu se escrevo tão mal e tudo sai tão a ferros e há quem o faça tão deliciosamente… 

Que interessa isso, se a escrita, o ler, o ouvir a leitura, te salva da loucura todos os dias, que interessa isso!? Bem sei que interessa se a tua intenção é ser um escritor, pertencer a uma das mais altas castas que se erguem ao mais alto nível do nível mais elevado do ser mais alto que existe acima das mais altas alturas da sociedade… Bah! Não interessa nada rapaz. Nada. 

As escalas, métricas e réguas são de outro lugar, da Ciência, por exemplo, e lá ficam muito bem. Tu que escorregas vida adentro todos os dias, do mesmo modo que todos esses altíssimos escritores, vão todos vida adentro com as mesmas relíquias. A diferença está na fama. A tua é zero e continuará. Mas não estás louco, como os famosos também não estarão. Só não escreverás deliciosamente nem terás fama. Só isso. Bom, há mais do que deliciosamente, há uma escrita que te deixa depois, e não és o mesmo, não. A minha nunca fará isso, mas a desses que escrevem, que dão a sua vida por essas páginas de magia e ao mesmo tempo eternas, obrigado. Sem isso era a loucura.

escrever

escrever

As palavras queimam e fogem. E o escritor também. Foge a sete pés. Não se lembra de uma, que se encaixe, mesmo que retorcida esbaforida louca. Ou então cai-lhe uma vinda de não sei de onde, num momento qualquer sem lógica nenhuma. Como raio vieste tu aqui parar!? Lá se pode terminar o parágrafo, a frase, essa simpática que se deitou meliflua como seda. Ah, se isso acontece, morremos.

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ler e escrever

O que seria um sem o outro?
“A arte de ler é, em muitas maneiras, contrária à arte de escrever. Ler é um ofício que enriquece o texto concebido pelo autor, aprofundado-o e tornando-o mais complexo, concentrando-o par que reflicta a experiência pessoal pessoal do leitor e expandindo-o para que alcance os mais longínquos confins do universo do leitor e mais além. Escrever, ao invés, é a arte da resignação- o escritor tem de aceitar o facto de que o texto final não será mais do que um reflexo turvo da obra que concebera na emnte, menos ilumnado, menos subtil, menos pungente, mesno preciso.”
Alberto Manguel, Uma História da Curiosidade, p.12, Tinta da China, MMXV, Lisboa.

O Fraco

[se vais à vida, vai com o peito de frente e o corpo todo por diante, sem adiar seja o que for, que envelhecer é possível e morrer certo.]

https://ofraco.wordpress.com/

vertice2

loucura

Qual é a tua? Em que loucura vives?

Quem és nessa loucura? Rei, senhor, guerreiro ou artista?

Qual é a justiça que vive nessa loucura? Só a tua, só a dos outros, ou a nossa?

A que distância fica essa loucura das outras? Aqui mesmo ao lado ou tão longe que nem sequer deveriam existir.

E o que farias às loucuras dos outros? Extreminá-las, ignorá-las ou visitá-las.

E nessa loucura, consegues esconder o agressor ou apetece exterminar?

Vai este planeta doente como vai quando não se ensina a cuidar da agressividade e não se aceita a loucura dos outros. De facto somos loucos, todos, sem excepção. Eu incluso.

 

imperfeito

sei-lhe o fim. Foi hoje, empoleirado no vazio, que o meu cérebro chutou para fora e vai ser mesmo assim o final de “O Fraco”. Uma treta de livro que me rouba a paz vai mais para bem perto de vinte anos. E é simples claro. Não és um fraco, és imperfeito. Bem certo, disse-lhe a ave.

Imperfeito. Como tudo o que fazes ou fizeste ou vais fazer. Como imperfeito são as mulheres e os homens. As crianças e os jovens. Tudo. Disseste tu e sei eu. Que fraco me sinto, mas que fraco não sou, só imperfeito.

homem-mulher-grande

A noite caía, a cidade estava muito distante, não havia como voltar neste exato instante, o sono atrapalhava-se com a emoção, os restos de um rapaz que quer ser homem. Os campos por ali estavam, as casas, as árvores, até os animais pareciam os mesmos, parados na paisagem. Nada muda? É esse o maior desejo? Que o mundo não mudasse nos bons tempos. Que fosse possível reter o que nos faz felizes. Deter o tempo. O que nos dá segurança. Ser homem-mulher-grande é exactamente aceitar o inverso. Aceitar a incerteza. O caos. A diferença. A mudança. A velocidade.

livro

havemos de nos encontrar no silêncio de um livro, escrito, por acaso por mim, com o único intuito de dizer que humanos somos, compaixão temos, e tu como eu, sós estamos, e permanecemos, mesmo depois de o teres lido, só que desta vez saberás que existe outro, tão só como tu.

botas

entraram botas     atravessaram o pátio de cima para baixo     eram negras e lustrosas     várias     voltaram     agora circulavam na diagonal      umas atrás das outras    disciplinadas     sincronizadas     aflitas     pararam com estrondo      pus os olhos no livro     escondi-me  na multidão     eu numa fila     os outros noutra      encolhi-me ainda mais     até que o livro se fechou também     Fujam filhos      que isto vai aquecer     disse o polícia (mais esférico que um balão)

sem data, possivelmente , Fev 2009