Os funcionários 

Estava a pensar numa história assim. Feita de tantos feitos, feitos já feitos, já passados. Baseada na história de Eichman, a partir do julgamento descrito por Hanna Arendt, em Israel, a dizer que somos cataventos, dançando conforme os tempos políticos, com pouca autonomia, discernimento, clarividência, pouco corajosos, somos todos assim, constrangidos por milhentas desconfianças em nós mesmos, à espera do grupo suficientemente grande onde cabemos e onde nos sentimos seguros. Somos mesmo assim. Outros não, arrastam-se convencidos, confiantes de que é esse o caminho, seja Eichman como um Resistente Francês, seja pelo ideal de superioridade pré-definida, seja pela liberdade, confiam que é esse o caminho, seja miserável ou pela alegre. seja pela intolerância ou pela tolerância, seja por uma certa ordem ou pela diversidade. Acabamos todos por ser funcionários de um ideal, mesmo que não concordes com esse ideal, acabas, por em geral aceitar isso, porque convém naquele momento. Eu acima de tudo, desde que eu sobreviva.

aristides

Pois bem, em Vilar Formosa estiveram famílias cujos ascendentes por ali passaram noutros tempos. Decidiram plantar uma árvore, um robusto carvalho. Muito bem. Símbolo de longevidade e força, tal como o exemplo do que este homem fez. Muito bem repito. Mas o dito carvalho está seco. Passei por lá e vi. Procurei, para o fundo da estação, junto a um lugar esquecido, um não-lugar.

A triste sina deste homem, molestado pelo facisto, molestado pela democracia, ou alguém andou a enganar alguém com a visita dos familiares? Ou alguém anda a vender a alguém qualqure sonho? Pena que se use essa história de coragem, que uns sonham que sabem o que é e outros, poucos, sabem o que significa. Será?

 

mudança

Não sou futurologista. E se fosse, fechava bem os olhos, cerrava-os com os dentes, mesmo que fizesse figura de parvo, só para não o ver, ao futuro digo eu.

A mudança é tal que nem a consigo imaginar. Portugal daqui a dez anos? Eu imagino-a grande, mas parece-me ainda maior.

Já a viram. Já a tentaram vislumbrar. À mudança digo eu. Corrupção, transparência, justiça, educação, parlamento, política… e não falo apenas dos políticos, falo de todos, de tudo o que em cada um tem de mudar.

E a coragem para fazer isso? É a mesma coragem de um Vasco da Gama e de quem o acompanhou. É a mesma coragem de um Salgueiro Maia e de quem o acompanhou. É a mesma coragem de Aristides de Sousa Mendes e de quem o acompanhou. É a mesma coragem de qualquer um dos anónimos portugueses que já habitaram Portugal ou que o tiveram de deixar. São tantos corajosos. Agora chegou a nossa vez.

E se tiver de haver porrada para fazer essa mudança? Ai é que a coisa começa a deixar de ter graça.

caminho

enredados nas palavras que devem ser, quando as que são, são as nossas. Feliz de quem tem coragem, de quem se arranca, feliz de quem, assustado, arrasta o medo noite dentro, fazendo caminho.