bem sabemos o que iremos dizer daqui a 20 anos…

Artigo de Pedro Ramos, Nascer do Sol, 21 agosto 2021, https://sol.sapo.pt/artigo/744332/tecnologia-e-arquitetura-de-vida

Para quem pode seguir estas linhas que o faça. Há quem não possa. Não saiba. Nem sequer faça parte do imaginário. Por pobreza, também vai quem não pode. Por estar de mão atadas a afazeres impossíveis de delegar noutros, igualmente. Quem puder, faça favor. Eu não posso. Há estacas amarradas ao meu corpo, algumas cravadas, outras soltas, todas fazem com que os pés não toquem no chão, quanto mais me façam caminhar, sequer imaginar caminhar a não ser ao passado, esse esconso lugar quente, onde te enroscas seguro, ouves vozes mudas, de outros tempos, vozes que te fazem respirar. Quem puder, por favor, faça-o.

a falta que os outros nos fazem e somos capazes de dizer tão mal deles. Desdenhar até, deles, claro. Isso naõ mudaremos. Outra esperança na paragem seguinte, e podemos até pensar que esta pandemia nos fez mudar de velocidade. Não sei se o continuaremos, talvez, era bom, mas não: a avidez da novidade faz-nos correr. Mesmo bom, que em vez de automóveis, houvessem apenas bicicletas. A velocidade é dez menos. Viveríamos dez vezes mais. Hum?

Os outros

O que se falava em sussuro, começa a falar-se no telejornal. O que dizem: “o outro não interessa! “Eu” é que sou a referência, o iluminado.” Pois bem, esses iluminados, necessitam que nos levantemos do sofá e clamemos por democracia, pela diversidade, pela generosidade e tolerância, pelo bom senso, pelo saber e pela luta contra a ignorância: Camus falava disso. Bem sabemos aonde é que esses iluminados nos levam; bem sabemos aonde nos leva a ignorância; bem sabemos aonde nos leva a intolerância: guerra, miséria, confrontos. Se a vida já é dificil, mais dificil fica. O sistema democrático tem ainda essa falha terrível: a transparência, ou melhor, a falta dela. Ao contrário, estes “lobos vestidos de cordeiros” têm muitas palavras-chave para vender o seu produto, para capitalizar votos, o que significa que, nos próximos 40 anos, andaremos a lutar pela LIBERDADE, como outros fizeram por nós! O que estes “iluminados” pretendem é o poder, só por si, não pelos outros.

sorte

que sorte, temos a morte

o que seria viver por aqui eternamente

vendo tudo igual, como há 500 anos atrás

ou mais longe

até os gregos nos dizem o mesmo, seja na literatura ou noutra expressão qualquer

que sorte, temos a morte

comum

e o que é comum a todos? Olhando para estas fotos de outro mundo. Há outros de outros mundos. E no fim resume-se a pouco o que é comum entre todos os bípedes que falam com o protocolo humano que se diferencia de sitio para sitio.

As mulheres são ligeiras, usam lenço, ou burca ou se despam com saber, sofisticadas, limpas, suaves como veludo, diretas ao que lhes interesa, às vezes inseguranças como quase todos os homens e estes vivem uma angústia tamanha de lhes faltar o tempo para mostrarem do que são capazes, é uma angústia e uma depressão severa, usem que roupa usarem.

E comunicamos à velocidade que nos for possível no momento, guardamos a família e os haveres e não, não gostamos de estar parados porque sabemos que no outro lado fazemos a diferença. Há momentos de guerra severa em que se salta a cerca da humanidadee se cortam pescoços. Há momentos de generosidade em que se dá toda a vida por inteiro por um povo ou só por uma mão que pede.

Cada uma destas fotos deveria e mereceria e virá a ter a sua legenda. A interceção seria interessante para perceber o que vai na mente do ser humano tão frio e quente ao mesmo tempo dependendo da história que lhe contarem e de que modo acredita nela, se lhe trás algum valor em aceitá-la.

Quem sentarias?

Imagina que podes escolher duas pessoas para se sentarem aqui à conversa. Quem seriam?

Sério, seria eu e o Educardo Lourenço, queria ouvi-lo responder às minhas ansiedades. Mas para ele seria um aborrecimento conversar com uma mente tão limitada.

O melhor seria mesmo sentá-lo com o a Elvira Fortunato, e não é por uma questão de paridade de género. É porque são duas pessoas, daquelas a sério, e há muitas neste planeta Portugal, mas que nem liga, elas não precisam de aparecer, mas nós precisamos delas tanto tanto… por exemplo, para uma coisa simples, evitar os vinte mil milhões e a corrupção em que nos vamos afundando. E outras coisas claro.

doisBancosJardim

mudança

nem sequer disse, não disse mesmo “não mudes”, não o pediu, estava bem assim, mas viu mudar, uma atrás de outra, confortável, atónito, estático, amarrado, sem nada fazer, sem nada poder fazer, viu todas, uma de cada vez, inocentes cada uma, fulgurantes todas, peças de dominó derrubadas em catadupa, esses confortos garantidos, derrubados um a um, diz agora, não mudasses que não suporta este desconforto… e não disse mais nada, estava feito, já só o som de memória dessa porta espantada, essa pancada estridente, fechada para sempre, revesse sem querer, continua a ir e vir, e volta sempre, não mudasses pá, não mudasses, esse que não se quer rever, esse filme morto, o lugar morreu… vai este mundo vazio, e mais vazio ainda se lês as notícias de todos os dias, ano atrás de ano. Vai este mundo vazio de pensamento a uma velocidade vertiginosa, tudo sempre a mais e à frente e em mudança, sempre a mudar e depressa. Nada dura uma geração, muito menos duas ou três. Mudança. Talvez te sirva de lição, que o mundo muda, eu não queria que mudasse tão depressa, a esta velocidade gigantesca, absurda e acelerada.

Amor

Disse-me mesmo à beira do balcão, com meia dúzia de garrafas  em frente, que o sexo ou o amor que fazia com a mulher, sabes?, não me lixes, isto não sai daqui, que a minha mulher é tudo para mim, enquanto o faço, enquanto isso, percebes, pensava noutras, que via por aí, a mulher já não o excitava, sempre da mesma forma, mas amava-a e não quero outra mulher, nem sequer estar com mais ninguém que não ela,  percebes?, se não pensar nas outras mulheres não consigo. Daqui só vou quando estiver sóbrio, não entro em casa desta maneira, ela não sabe que bebo, talvez desconfie, também não sabe que penso nas outras, talvez desconfie, mas isto deixa-me de rastos, pesa na consciência e bebo para esquecer, levo-lhe flores, não me esqueço de a convidar para um copo, ofereço-lhe sempre algo especial no aniversário, ou quando me lembro do melhor dia da minha vida, o nosso casamento, e lembro-me dela quase todas as horas do dia. Se ele saísse da minha vida era como se arrancassem um pedaço de mim, espero que eu morra primeiro para não ter que sofrer a morte dela. Fiquei calado e fui ouvindo. E perguntei-lhe o que pensaria ela para fazer amor com ele? Em que pensaria ela? Eh pá agora é que mataste a coisa… Sim, ela também terá as suas estratégias.

fama

Se a coisa não presta põe-lhe muita luz e som, cor e floreados, publicidade e video, que isso vende na mesma. Bem verdade que há muita outra coisa submersa, sem dar nas vistas, de enorme qualidade. As duas ao mesmo tempo já é mais dificil. Falo de música que até robots tem, mas a música viste-la, e outra música que só tem voz ou instrumentos e a coisa deixa-nos nas nuvens. Não a publicitaram mas ainda bem que estamos a ouvi-la. E vai assim para outras artes. O que muito é famoso, e na maior parte dos casos, muito mau em conteúdo. Vê-se muito bom e que está escrito numa folha de papel e pequena. Cada um decide o que ver e o que ler e o que ouvir.

amor

Não tens tempo de ouvir a pergunta quanto mais dizer a resposta e já lá estás, uma pulsão abrupta, e só deixas de tremer mais quando estás perto, mas isso chama-se paixão. Dura pouco, não mais que dois anos. Dizem.

Lá para depois da quarta paixão ainda não controlas o que dás. Mas não vais ter ninguém a dizer-te o que fazer, nem sequer uma arma apontada à cabeça, nem é preciso, porque já deste tudo o que tinhas. Se mesmo assim a paixão não dura e o amor não fica, o corpo quebra-se no chão.

Se ficas depois da primeira guerra, depois da segunda aflição, depois do terceiro problema sério, depois da morte, já lhe podes chamar isso maior, amor.

Lá para depois do primeiro amor vais controlar o que dás.