Escrever porquê?

As palavras fogem e queimam, e tarde se descobre a vontade de escrever mais uma palavra, mesmo que encaixe retorcida esbaforida quase próximo da loucura, no minuto antes de terminar o parágrafo. A cada uma vais tu perguntando que merda faço eu se escrevo tão mal e tudo sai tão a ferros e há quem o faça tão deliciosamente… 

Que interessa isso, se a escrita, o ler, o ouvir a leitura, te salva da loucura todos os dias, que interessa isso!? Bem sei que interessa se a tua intenção é ser um escritor, pertencer a uma das mais altas castas que se erguem ao mais alto nível do nível mais elevado do ser mais alto que existe acima das mais altas alturas da sociedade… Bah! Não interessa nada rapaz. Nada. 

As escalas, métricas e réguas são de outro lugar, da Ciência, por exemplo, e lá ficam muito bem. Tu que escorregas vida adentro todos os dias, do mesmo modo que todos esses altíssimos escritores, vão todos vida adentro com as mesmas relíquias. A diferença está na fama. A tua é zero e continuará. Mas não estás louco, como os famosos também não estarão. Só não escreverás deliciosamente nem terás fama. Só isso. Bom, há mais do que deliciosamente, há uma escrita que te deixa depois, e não és o mesmo, não. A minha nunca fará isso, mas a desses que escrevem, que dão a sua vida por essas páginas de magia e ao mesmo tempo eternas, obrigado. Sem isso era a loucura.

perguntas cruciais

“Talvez toda a curiosidade possa ser resumida na famosa pergunta de Michel Montaigne, “Que sais-je?”, “Que sei eu?” [1].
 
A pensar nisto, talvez que uma pergunta melhor fosse, “o que quero eu saber?” E ai poderemos saber, poderás saber, qual o caminho que vais percorrer. Qual seria a tua pergunta crucial?
[1]. Alberto Manguel, Uma História da Curiosidade, p.12, Tinta da China, MMXV, Lisboa.

sem ver o Sol podes viver. sem deixares entrar luz não deixas viver nem vives. se alguém souber abrir estas portadas bem faria. viveria e faria viver. ou melhor ainda, faria sorrir.

nunca vi Sol

certinho

vieste hoje dizer-me que não. que não é possível. que não faz sentido. melhor é ficares ai sentadinho à luz do ordenado certinho. ora os inhos são simpáticos mas não te fazem, não fazes, não me fazem.

não é que os inhos dos outros me causem repulsa. nem sou contra eles. cada um tem os seus. mas eu não gosto dos meus. e por isso vim dar o que já está feito. um livro. meu. só meu. cozinhado, escrito e empratado por mim. sem tirar nem pôr. do princípio ao fim.

o único desejo agora é o mesmo que desejamos aos filhos. se ganharam pernas, que andem por si, só por si. se for ao contrário, pois tristes ficamos mas o mundo não se importa com isso. só eu. só eu me importo.

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O Fraco, versão do meio
O Fraco, versão do meio

bilhete

Reconhecia ao fundo uma silhueta de um homem e da sua carroça. O animal puxava a enorme carga com esforço, a mando do dono empenhava-se em vencer as agruras do caminho; a carroça pesada cambaleando como um embriagado ligada ao corpo do animal por cintos, que apertavam como um cilício; aos dois, sem tréguas, o vento e a chuva fustigavam as capas humildes, que mesmo assim se adiantavam por entre o ardil da Natureza. O dia começava cedo por estas paragens, e mesmo a chuva não impedia que a vida prosseguisse lenta e estóica. Eram estes os lugares da vida, da morte e da criação, eram lugares onde o tempo não existia, lugares serenos, ocultos e sem novidade. A sua beleza nascia com as gentes, nascia sem querer e mantinha-se eterna; não era suficiente ser para viver ali, era necessário nascer aqui para se viver naqueles lugares, para mim, magníficos. Pensava eu que o meu caminho era adiante, quando afinal aqueles lugares que o meu olhar breve observava escondiam o ser e a serenidade. Quantas vezes o sentira durante os passeios pelas terras da minha terra, mas agora a minha vontade era outra e… só deixara um bilhete àqueles tão chegados,

O Fraco, Franz E., 2ª parte, p.21 e 22

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escrever

Está contigo e com tantos outros. E sabe bem um prémio, nem que seja o de um  amigo que diz: “gosto do que escreveste!”. É mesmo bom. Tantas horas de volta de uma parágrafo, e até funcionou. Que bommm!

Essa coisa da escrita esteve, está e estará, nem que seja para uma pessoa só. Só útil para um. E gostamos de o fazer naqueles momentos inspirados. Depois de um café. Numa esplanada. Ou numa biblioteca acolhedora. Bem queríamos que fosse útil. Uma história serve para dizer aos outros o que se passou: “comigo foi assim”. Pode ajudar contar.

É certo que bem gostamos que nos leiam. O outro extremo é a fama. Quase todos os humanos a querem. Mas tem amargo. Há quem goste: a notoriedade. Embora signifique “viver da escrita”. Há muito poucos que realmente vivem disso. Os seus nomes passaram a ser uma marca. Vende. Muitos deles queixam-se exactamente disso, são uma coisa.

Quanto ao trabalho, é para lá de muito, mas não interessa: “Quem corre por gosto não se cansa”.