Os dias adormeceram, a alegria era a da solidão, de nada ter que fazer, nenhum compromisso, estar porque se estava, numa ou noutra posição não interessa, horas e horas, dias e dias até deixar de saber que dia sera, se tinha comido ou o que seria a ceia, a fazer nada que não fosse coisa nenhuma, votado à imbecilidade estúpida de não servir para nada. Irritava que fizesse alguma coisa ainda. Estar como estavam os grão de areia que se escondiam uns atrás dos outros até ao mar, sem ter que decidir, sem ter que me aceitar nem gostar de mim próprio, ser grão de areia. E sentia outra dimensão, uma forma, uma caixa que nos adorna o corpo. Impede. Impede que sejamos. É uma realidade psicológica. Não estamos certos de onde vem. Como chegou aqui. Podemos apenas imaginar, supor ou teorizar. Mas agora o espírito é colorido, brilhante e suave; tão perfeito como o brilho do Sul, tão azul como o verde do mar que nos sacode. O tempo é largo como se um segundo fosse agora todo o tempo e o espaço perdeu-se misturado com o silêncio e a mente apagou-se com a solidão: mente, espaço e tempo não têm significado quando se vive isolado. Sei o que fiz. Sente-se que se vive. Neste planeta sobrelotado de tarefas a vida foge quando se olha para trás, o que fiz hoje? Foram tantas as tarefas, em nenhuma se parou, se fez, se apreciou.
O Fraco, Barcelona 2014